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O Budismo no Brasil

Por Cristina Moreira da Rocha Candidata Ph.D., Departamento de Antropologia Universidade de Săo Paulo, Brasil

 

A Chegada do budismo no Brasil

O budismo foi introduzido no Brasil pelos imigrantes japoneses que chegaram inicialmente em 1908 no porto de Santos, em Săo Paulo. Emigrando para trabalhar no café, algodăo, e plantaçőes de banana, eles tinham a intençăo de retornar ao Japăo assim que acumulassem o necessário. No fim do décimo nono século, o Japăo estava deixando o sistema feudal para atrás e entrando em um período de dificuldades econômicas; a população rural era especialmente bruta. Consequentemente, o Governo de Meiji (1868-1912) quis aliviar a pressão na terra, criando colônias que aumentariam a produção de comida para exportar de volta para o Japão.(1) O Governo brasileiro, por outro lado, precisava de operários para as plantações desde que escravidão tinha sido abolida. O Brasil se tornou independentes em 1822, mas ao final do século, as idéias do abolicionismo e republicanismo estavam em todos lugares. Ambos os movimentos foram bem sucedidos: a abolição de escravidão foi ratificados em 1888, e o Brasil se tornou uma república federativa em 1889.

Os imigrantes masculinos japoneses que migraram para o Brasil não eram primogênitos. Devido à regra de primogenitura no Japão, o primogênito herda toda propriedade da família, bem como a responsabilidade de cuidar da casa e de manter os antepassados. Tendo tantos deveres, eles não podiam emigrar. Consequentemente, as crianças mais jovens foram os que deixaram o país para buscar uma vida melhor em outro lugar. Como resultado, porque eles não estavam em idade de promover cerimônias religiosas para os antepassados, a religião não foi em suas vidas.2() Eles só se voltaram para religião no momento das mortes dos membros familiares no Brasil.(3)

Além disto, o Ministério Japonês de Negócios Estrangeiros proibiu monges japoneses de acompanhar os imigrantes para o novo país porque sua presença podia demonstrar uma evidência de não assimilação japonesa da cultura brasileira , basicamente católico romana.(4) De fato, naquele tempo havia um debate contínuo no Congresso brasileiro sobre a habilidade dos japoneses para assimilar a cultura brasileira. Muitos senadores quiseram parar imigração japonesa completamente. A discussão era pública, e muitos jornais publicaram artigos mostrando os imigrantes japoneses como inassimiláveis.(5)

Não obstante, a relação entre os imigrantes e a religião japonesas mudaram completamente quando o Japão foi derrotado na Segunda Guerra Mundial. Os imigrantes tiveram que desistir de seu sonho de retornar a sua pátria porque o Japão foi destruído tanto economicamente como moralmente. Porém, depois de anos de trabalhar em áreas rurais no Brasil, os imigrantes japoneses começaram a ascender socialmente e a se tornar mais urbanizado. Devido às condições de trabalho terrível, enfrentadas por imigrantes japoneses, nas plantações em sua chegada, a maioria deles procurava economizar bastante dinheiro para deixar as fazendas e comprar sua própria terra. Além disto, negociantes japoneses com recursos próprios e o governo japonês (sob o Kaigai Kogyo Kabuhiki Kaisha) investiram no Brasil, comprando terras para os imigrantes formarem colônias japonesas. Depois de trabalhar e prosperar na terra, os imigrantes japoneses então começaram a mudança para ambientes urbanos e o estabelecimento de pequenos negócios. Os que permaneceram nas áreas rurais se tornaram produtores, proprietários, e distribuidores de e outros da terra.(6) A migraçăo para a Cidade de Săo Paulo se tornou intensa depois do anos 50. "Em 1939, só 3.467 imigrantes japoneses e seus descendentes residiam em Săo Paulo. Mais ou menos 20 anos mais tarde, eles totalizaram 62.327. Nos anos 70, ao redor uma terça parte da populaçăo japonesa e seus descendentes estavam concentrados na área da Grande Săo Paulo."(7) Hoje existem 1,28 milhăo de japoneses e descendentes no Brasil.(8)

A migração para a metrópole era também parte do projeto econômico do Brasil. A denominado "vocação agrária nacional" não causava mais nenhuma sensação. O país estava enfrentando o motim da industrialização e urbanização do pós-guerra, e o poder político estava mudando da aristocracia rural para os magnatas industriais. Săo Paulo, com uma populaçăo de 2.817.600 em 1954, emerge como a maior metrópole brasileira, superando a capital, Rio de Janeiro.(9)

Devido à decisão da maioria de imigrantes japoneses de permanecer no Brasil (por causa de derrota do Japão na Segunda Guerra Mundial, como também por sua ascensão socio-econômica, urbanização, e a aproximação da velhice de muitos dos imigrantes), várias religiões japonesas—entre elas o budismo, o shintoismo, e as novos religiões de inspiração shintoística e shamanística —começaram a ser professadas mais intensamente no Brasil.(10)

A derrota japonesa na Segunda Guerra Mundial fez os imigrantes perceberem que eles teriam que assimilar culturalmente a sua nova pátria. A fim de ajudar seus descendentes a se aculturarem mais facilmente, um padrão foi estabelecido: os filhos mais jovens foram para a escola, e os mais velhos ficaram em casa para seguir a profissão do pai, e assim manter negócio familiar. Dois tipos de nisei (segunda geração) foi criado: o irmão primogênito, que falava japonês, estava mais amarrado aos valores japoneses e ao estilo de vida japonês. Além disto, o irmão primogênito seguia uma religião japonesa. Por outro lado, as crianças mais jovens, que empreenderam a missão da ascensão socio-econômica e foram para a universidade, não eram fluente em japonês, e convertiam-se ao catolicismo romano.(11) Eram comumente achados casos de pais batizando seus filhos como católicos romanos de forma que eles não sofressem discriminação. Em muitos casos, a conversão não era o resultado de condenação religiosa. De acordo com pesquisa empreendida em 1987-1988, 60% dos imigrantes japoneses no Brasil e seus descendentes eram católico romano, enquanto só 25% seguia as religiões japonesas.(12)

O Zen budismo no Brasil

De meados dos anos 20 em diante, começas a haver atividade religiosa nas maiores colônias japonesas (no Oeste de Săo Paulo e no Paraná). Embora existiam butsudan (altares budistas) dentro das casas japonesas, a religião que proliferou foi o shintoismo oficial (o culto do imperador). O ponto central deste culto era o nihon gakko (escola japonesa), que foi um lugar projetado não só para ensinar o idioma e a cultura japonesa com material enviado do Japão, mas também um ponto de encontro para a colônia, a sede da organização de agricultura cooperativa, um salão de baile para casamentos, e um santuário provisional para a recitação do Reescrito Imperial sobre Educação de 1890.(13) Em 1992, um livro comissionado para comemorar o octogésimo aniversário da imigração para o Brasil descreveu a relação entre a escola japonesa, o culto do imperador, e a religião nas condições seguintes:

O retrato do imperador é o corpo divino, o Reescrito Imperial sobre Educação a palavra santa, o hino nacional japonês o canto sagrado, o diretor da escola o monge, e a escola japonesa a deidade [assim] da aldeia. Deste modo era criada a "estrutura religiosa" dos imigrantes japoneses.(14)

A falta de cerimônias budistas é possivelmente devido ao período de ideologia de Meiji (1868-1912) e seu radical nacionalismo. Esta ideologia evitou religiões e filosofia estrangeiras como o budismo e confucionismo, enquanto divinizava o imperador. Em 1868, um decreto instituiu uma distinção entre as deidades do "Shinto" e o panteão budista, que previamente foi sincretizado. Os monges budistas que moravam em santuários de "Shinto" foram expulsos, e altares budistas destruídos. Movimentos anti-budistas (Haibutsu Kishaku) cresceram.(15) Este era o ambiente em que os imigrantes japoneses viveram antes de partir para o Brasil.

Quanto as religiões japonesas que conseguiram chegar ao Brasil — e consequentemente infringiram o édito do Governo japonês de que nenhum monge devia emigrar —, elas sofreram restrições e ameaças. Este foi o caso de novas religiões como Tenrikyoo, que chegou em 1929, Oomotokyo, e Seicho-no-iee.(16) Durante a Segunda Guerra Mundial, escolas japonesas foram fechadas, jornais no idioma japoneses foram proibidos (existiam quatro jornais japonêses diariamente publicados em Săo Paulo com uma circulaçăo total de ao redor cinqüenta mil exemplares[17]), e falar japonęs em público e em particular (inclusive nas casas de adoração) também foi proibido. Mas quando o medo do "perigo amarelo" diminui porque o Japão perdeu a guerra, as escolas budistas japonesas começaram a enviar missionários para o Brasil para pregação.

Não obstante, embora a idéia de que o budismo não foi disseminado no Brasil antes da Segunda Guerra Mundial é sustentado por muitos autores (Lesser, 1999; Clarke, 1999; Nakamaki, 1994; Comissăo de Elaboraçăo dos 80 anos da Imigraçăo Japonesa no Brasil, 1992; Saito, 1973, 1980; Saito & Maeyama, 1973), um autor contradiz esta idéia. O historiador Ricardo Gonçalves afirma que o primeiro navio, Kasato Maru, que ancorou no Brasil em 1908, trazia um monge do Honmom Butsuryo (uma filial da escola Nichiren) a bordo. Este monge teria estabelecido o templo mais antigo em Bauru, no Estado de São Paulo. Subseqüentemente, um monge da escola Shingon chegou, e em 1925, o primeiro monge da escola de Jodo Shinshu chegava. Em 1932, Jodo Shinshu estabeleceu o primeiro templo budista brasileiro em Cafelândia no Estado de Săo Paulo.(18) Embora seja perfeitamente aceitável que existiam congregaçőes budistas no Brasil anteriores a Segunda Guerra Mundial, a idéia de que as vidas dos imigrantes eram centradas em torno do culto do Imperador é também uma suposição aceitável. Ambas as teorias podem ser vistas para complementar uma a outra. Mesmo que os estudiosos aceitem o fato de que existia atividade budista antes de Segunda Guerra Mundial, ela realmente só se tornou institucionalizada depois dos anos 50. Todos estes autores concordam que depois da Segunda Guerra Mundial, as instituições religiosas no Japão enviaram missionários oficiais para estabelecer templos e pregar. Mesmo assim, esta contenção precisa de um estudo adicional.

Zengen-ji foi o primeiro templo Soto Zenshu Zen budista no Brasil. Construído no início dos anos 50 em Mogi das Cruzes, uma cidade próxima da Cidade de Săo Paulo, Zengen-ji foi construído com capitais do Soto Zenshu japonês e a ajuda da comunidade japonesa que vivia em sua vizinhança. O templo de Busshin-ji foi construído em 1955 na Cidade de Săo Paulo para ser a sede da escola de Soto Zenshu no Brasil. Foi também construído com capitais de comunidade japonesa e capitais da Sotoo Zenshu. Estes dois templos, junto com o templo em Rolândia no estado do Paraná, serviu para a comunidade japonesa brasileira por três décadas. Durante este tempo, seu trabalho missionário incorporou 3.000 famílias como praticantes.

Em 1955, a Comunidade de Soto Zenshu budista da América do Sul (Comunidade da América do Sul) foi estabelecido e oficialmente reconhecido pelo Governo brasileiro. No mesmo ano, a Sociedade budista do Brasil (Sociedade do Brasil) foi fundada por um brasileiro de origem não japonesa (Murillo Nunes de Azevedo) no Rio de Janeiro. Azevedo foi o primeiro brasileiro interessado em estudar o budismo "como um sistema filosófico e artístico." Ele era um professor de filosofia na Pontífice Universidade Católica (PUC) do Rio de Janeiro, onde ele ensinou filosofia do Extremo Oriente. A Sociedade budista do Brasil organizou conferências e exibiu filmes sobre budismo provido pelas embaixadas da Índia e do Sri Lanka.(19) Em 1961, Azevedo traduziu a Introdução do budismo Zen de D.T.Suzuki para o português. Porém, o interesse massivo pelo Zen e pelo budismo por brasileiros não japoneses não aconteceu até os anos 90.

As escolas de Nishi Hongwanji, Higashi Hongwanji (Jodo Shinshu), Jodo Shu, Nichiren, e Soto Zenshuu enviaram missionários para o Brasil no início dos anos 50. Os missionários buscaram famílias japonesas que eram associadas com tais escolas budistas no Japão antes de sua migração para o Brasil. Em 1958, todas estas escolas budistas foram unidas na Federação das Seitas budistas do Brasil (Federaçăo das Seitas do Brasil).

Os brasileiros de descendencia não japonesa começaram a buscar budismo Zen no início dos anos 70. Em 1968, a sede de Soto Zenshu enviou o monge japonês, Ryotan Tokuda, para o templo de Busshin-ji em Săo Paulo como missionário. Na sua chegada, ele abriu o templo para brasileiros năo japoneses. Trabalhando junto com estes novos praticantes, Tokuda fundou o primeiro monastério Zen da América Latina, o Mosteiro da Vargem, no estado do Espírito Santo em 1976. Em 1984, Tokuda estabeleceu um segundo monastério, Mosteiro do Pico dos Raios, no estado de Minas Gerais. Hoje seus abades são brasileiros de origem não japonesa que foram discípulos de Tokuda e estudaram em monastérios no Japão. Daiju (Christiano Bitti) se tornou o abade de monastério de Morro da Vargem em 1983 depois de passar cinco anos no Japão. Este monastério Zen é visitado por quatro mil pessoas anualmente e recebe sete mil crianças do estado todo ano que vai lá para aprender educação ambiental.(20) Além de ter mantido uma reserva ecológica e o Centro de Educação Ambiental desde 1985,(21) o monastério estabeleceu uma "Casa de Cultura" para patrocinar bons artistas que podem dedicar-se subseqüentemente a criar seus trabalhos longe da cidade. Além disto, o Monastério de Morro da Vargem realiza oito retiros de cinco dias todo ano com quarenta e cinco praticantes em cada sessão. As pessoas que assistem estes retiros não são necessariamente budistas, como Daiju sugeriu: "Em geral, as pessoas que buscam o monastério não professam qualquer religião. Eles estão à procura de paz espiritual."(22) O Monastério do Pico Dos Raios está também ligado a comunidade externa. Tokuda ensina acupuntura para os praticantes do monastério que oferece este serviço para a população local. Em 1984, Ryotan Tokuda estabeleceu a Sociedade de Soto Zen do Brasil (Sociedade do Brasil), cuja sede está no Monastério do Pico Dos Raios.

Em 1985, o Centro de Estudos Budistas (CEB) foi criado em Porto Alegre, capital do Rio Grande do Sul. O CEB incluiu praticantes de várias escolas de budismo, inclusive o Zen. Em 1989, praticantes Zen de Tokuda e o CEB inauguraram o templo Soto Zen Sanguen Dojô. Atualmente o templo segue a orientação de Daigyo Moriyama Rooshi e seu discípulo francês, Zuymyo Joshin Sensei. Moriyama é um mestre japonês que tem discípulos no Brasil, Argentina, Uruguai, EUA, França, Alemanha, Suécia, Áustria, Canadá, Coréia, e Sri Lanka.(23) Continuando seu trabalho missionário no meio de brasileiros não japoneses, em 1993 Tokuda fundou o Centro de Zen do Planalto em Brasília, o capital federal. Os planos do centro para o futuro é estabelecer uma biblioteca budista brasileira e uma universidade budista brasileira. No ano seguinte, Tokuda e praticantes brasileiros fundaram o Centro Zen de Rio de Janeiro. Em 1998, Tokuda estabeleceu o Monastério de Serra do Trovăo no estado de Minas Gerais. Este monastério foi fundado exclusivamente para o treinamento de novos monges e mantem dois retiros de sete dias por mes. É importante notar que Ryotan Tokuda tem uma conexão com Zen europeu. Ele tem grupos de Zen na Itália, França, e Alemanha. Em 1995, Tokuda fundou o École Nonindo de Medicamento Traditionelle Chinoise e a Associação Mahamuni, ambas em Paris.

Atualmente, existem vinte e três centros e templos Zen budistas, três monastérios Zen budista, trinta e quatro centros Tibetanos, sete centros de Theravada, trinta e sete templos Nishi Hongwanji (Jodo Shinshu) e vinte e duas associações (onde não existe nenhum monge de residente), vinte e seis templos e associações Higashi Hongwanji (Jodo Shinshu), dois templos de Jodoshu, quatro templos de Nichireshu (com 5.000 famílias de praticantes) doze templos Honmon Butsuryu Shu (um ramo do Nichiren), e quatro templos de Shingon (com 850 famílias de praticantes) no Brasil.(24) O budismo de tibetano, que foi o mais recente a chegar (1988), está sofrendo um expansão semelhante a que está acontecendo no Ocidente. De fato, budismo em geral está se tornando melhor conhecido e está atraindo atenção da mídia no Brasil. Em junho de 1998, revistas brasileiras importantes publicaram três artigos sobre a expansão do budismo e da meditação no Brasil e seus aderentes famosos (estrelas de televisão, políticos, etc).(25) A Revista Elle apresentou a Lama americana Tsering Everest, como também o tibetano Chagdud Rimpoche, que mudou dos EUA para o Brasil em meados dos anos 90. Lama Tsering notou que este "é o momento certo para budismo no Brasil . . . o envolvimento de brasileiros com budismo é carmico." O Lama tibetano Chagdud Tulku Rimpoche está construindo dois monastérios: um em Três Coroas no estado do Rio Grande do Sul, planejado para alojar 400 pessoas durante os retiros, e um outro em Brumadinho, no estado de Minas Gerais. O artigo da revista Elle estima o número de praticantes budistas em torno de 500.000, distribuídos entre Tibetanos, Nichiren, Soka Gakkai (150.000 praticantes), Jodo Shinshu, Jodo Shu, Shingon, Theravaada, e Zen.(26)

As únicas estatísticas confiáveis disponíveis em religião no Brasil são do censo de 1991. De acordo com este censo, a população brasileira (170 milhões pessoas) inclui cidadãos das seguintes afiliações religiosa: 83% católico romano (141.1 milhão), 6% pentecostal (10.2 milhão), 3% tradicional evangélico (5.1 milhão), 5% sem afiliação religiosa (8.5 milhão), 1% espíritas (1.7 milhão), 0.5% de diversas religiões africanas (850.000), 0.2% budista (340.000), e 0.08% judeu (136.000).(27) Como as estatísticas mostram, a grande maioria de brasileiros vêm de famílias católicas romanas. O que estes dados não mostram é a migração simbólica de uma religião para outra, que acontece freqüentemente no Brasil. Muitos brasileiros ou praticam mais de uma religião ao mesmo tempo ou migram de religião para religião.(28)

Além disso, embora o número de budistas seja só 0.2%, temos que considerar que para a maioria de brasileiros, budismo é mais um "filosofia", um "estilo de vida" que uma religião. O budismo Zen é freqüentemente visto como uma técnica de meditação que ajuda a aliviar tensão. A abadessa Coen do Busshin-ji sustenta esta forma de ver o budismo Zen em uma entrevista para o jornal O Estado de São Paulo: "Não é necessário ser um budista para praticar este tipo de meditação. O templo oferece várias palestras para aqueles que desejam aprender esta atividade, ainda que eles não tenham nenhuma intenção de se tornar budistas."(29) Na mesma reportagem, um praticante ressalta que "o Zen budismo foi um caminho para despertar minha sensibilidade sem negar minha religião católica." Como resultado, ser budista não exclui professar outras religiões. Muitos brasileiros continuam a ser católico romano mesmo adotando o budismo. Se perguntar que religião eles professam, é mais provável que eles declarem que são católicos (porque eles foram batizados) ou não tenha nenhuma ligação religiosa (se eles não professarem qualquer religião) embora eles possam ter adotado o budismo como um estilo de vida.(30) O abade do monastério de Morro da Vargem, Daiju (Christiano Bitti), reforça este ponto de vista em uma entrevista para a Revista Isto É: "Se um católico romano considera sua religião como um estudo de sí mesmo, então ele/ela é também budista. Padres católicos romanos, que foram iniciados no budismo, disseram para mim que depois de conhecer o budismo eles entenderam a Bíblia melhor. O não tem budismo nem a intenção de disputar praticantes nem de convertê-los. As pessoas ficam à vontade porque nós não estamos disputando qualquer coisa. Nós só queremos fortalecer a fé do povo brasileiro."(31)

Conflitos

Como os monastérios, templos, e Centros Zen — todos estabelecidos depois de 1976 — atendem principalmente os brasileiros não japoneses, não existe nenhum conflito sobre a forma como a pratica Zen budista é realizada. Porém, quando imigrantes japoneses e brasileiros não japoneses compartilham o mesmo espaço, surgem dissensões. Este é o caso d o templo Busshin-ji em Săo Paulo.

Inaugurado em 1955 e suprindo as necessidades da comunidade japonesa por mais de três décadas,(32) Busshin-ji sofreu consideravelmente quando um novo abade foi designado pela escola de Soto Zen do Japăo. Em 1993, monge japones Roshi Daigyo Moriyama chegou em Săo Paulo com novas idéias sobre como a prática de Zen deveria ser.

O mestre japonês vinha de um contexto onde o Zen budismo estava altamente institucionalizado e estruturado devido a nove séculos de história no Japão. Além disso, devido ao patriarcalismo e a primogenitura que são parte da regra de sucessão da sociedade japonesa, os meninos que entram nos monastérios para se tornarem monges são os primeiros filhos nascidos de famílias que possuem ligações com os monastérios. Como resultado, ser um monge se torna uma profissão como qualquer outra, um modo de fazer sua vida dentro de uma estrutura rígida.(33)

Enfrentando esta situação, o mestre decidiu deixar o Japão à procura de um Zen mais ativo. Tendo trabalhado com Roshi Shunryu Suzuki em São Francisco nos anos 60, Moriyama compartilhava as idéias de Roshi Suzuki de que os estrangeiros têm "a mente de principiante (shoshin), que está vazia e pronta para novas coisas."(34) Quando entrevistado em 1997, ele disse que no Japão, os monges estavam mais interessados no dinheiro a ser recebidos em práticas sociais por serviços realizados para a comunidade (enterros e adoração de antepassados) que no trabalho espiritual. Meditação (zazen), entrevistas com o abade (dokusan), estudos do Dharma, retiros (sesshin), e trabalho manuais (samu) — todos recursos para ajudar no caminho da iluminação — não eram corretamente praticado. Como Roshi Moriyama declarou:

É por isso que eu ponho minha energia em um país estrangeiro; aqui o Zen pode ser recriado de uma forma mais pura. O budismo japonês é a impermanência de Buda e os ensinos de Dogen (entrevista Pessoal, 1997).

Porém, com sua chegada ao Brasil, o mestre encontrou uma comunidade japonesa que exigia a execução das mesmas práticas ele não estava disposto a fazer no Japão, isto é, "massas" (como os membros da seita denominam as cerimônias no Brasil), casamentos, enterros, e adoração de antepassados, em vez de uma prática baseada na meditação.

O conflito se tornou até mais sério quando o mestre japonês encontrou um grupo de brasileiros de origem não japonesa que estava bastante interessado em meditação e em ensinos de Buda e Dogen. No momento em que estes brasileiros entraram no templo e começaram a interagir com a comunidade brasileira japonesa, conflitos surgiram. Como resultado, em 1995 a sede da escola de Soto Zenshu no Japão retirou Roshi Moriyama de sua função devido à forte pressão da comunidade japonesa. No Japão, o abade primogênito, herda o templo de seu pai. No Brasil, os templos são da comunidade japonesa. Como resultado, missionários japoneses (que são designados pela sede japonesa) precisam provar que são bons proselitistas. Como a comunidade japonesa ficou insatisfeita com o trabalho de Moriyama, ele foi chamado de volta para o Japão pela escola de Soto Zenshu. Vários de seus seguidores brasileiros deixaram também o templo e fundaram um novo Centro Zen (Cezen) em Săo Paulo onde o mestre é um mentor espiritual. Moriyama continua a viajar para o Brasil independentemente duas vezes por ano para visitar seus discípulos, promover retiros, e ensinar a Dharma em seus dois centros de Zen localizados em Săo Paulo e Porto Alegre.

Ironicamente, o sucessor de Roshi Moriyama — uma abadessa designada recentemente — foi uma monja brasileira de origem não japonesa. Claudia de Souza Batista foi ordenado em los Angeles por Roshi Maezumi em 1980 (quando ela recebeu o nome budista de Coen) e viveu em um monastério em Nagoya por seis anos depois disso. Coen assumiu a posição de abadessa em Busshin-ji e logo começou a executar todas as atividades mais estritamente do que antes. Um praticante brasileiro de origem não japonesa observa:

Quando Moriyama era o responsável pelo templo, ele tentou adaptar o Zen japonês para cultura brasileira. Foi mais flexível. Com Coen, como ela chegou recentemente do Japão, ela tenta manter os padrões e regras que ela viveu no Japão. Ela tenta impor tudo, o ritmo, o comportamento e a disciplina da prática japonesa. Ela é muito inflexível. (Cida, astróloga, 40 anos de idade).

O que faz este caso mais interessante é que tradicionalmente, a comunidade brasileira japonesa manteve algumas características culturais próprias que se preservaram da absorção pela cultura brasileira (entre elas estavam o idioma e a religião), para a manutenção de sua identidade de étnico.(36) Embora as segundas e terceiras gerações já começaram a assimilar a cultura brasileira (37) e são bastante integradas ao país hoje. A função de abadessa do único templo Zen budista em Săo Paulo năo seria uma funçăo que a comunidade poderia colocar nas măos de um "estrangeiro." Como, entăo, uma monja brasileira conseguiu a posiçăo mais alta em uma seita budista, e além disso, como poderia ela ter sido aceita pela comunidade brasileira japonesa?

Embora Coen seja uma monja brasileira, ela ganhou lentamente aceitação porque trabalhou duro para preservar as cerimônias que a comunidade japonesa esperavam ser executada. Ao mesmo tempo, falando japonês e português fluentemente, ela serviu como uma intermediária bem sucedida entre os japoneses e comunidades brasileiras. Este conflito de motivações, prática, e aspirações são semelhantes aos que aconteceram em outros contextos Ocidentais, tanto em centros budistas nos Estados Unidos como na Europa.

Apesar de que a comunidade de japoneses e brasileiros de não descendência japonesa têm práticas separadas em Busshin-ji, se deve pensar estas culturas como "organicamente ligadas e nitidamente diferentes."() Entre a comunidade japonesa e a sociedade brasileira, existem descendentes japoneses que foram educados de acordo com ambos costume japonês e brasileiro, e como resultado, têm padrões culturais misturados. Eles compõem um grupo pequeno de praticantes que começaram a ir ao templo por causa de pressão familiar e acabaram assistindo as atividades oferecidas para os brasileiros de origem não japonesa. Muitos descendentes japoneses me disseram em entrevistas que um dos fatores que os fizeram escolher afiliar-se ao "Zen brasileiro (ou 'Zen convertido')" em lugar do " Zen da comunidade japonesa " foi o idioma falado porque descendentes japoneses não entendem o idioma japonês, que é usado nas cerimônias para a comunidade japonesa.

De fato, o português está começando a ser reconhecido como o idioma oficial de Templo de Busshin-ji. Em 1998, pela primeira vez, existiam dois grupos para participar da administração do Busshin-ji: uma composta dos quadros antigos de japoneses tradicionais e um nova grupo incluindo brasileiros de descendencia japonesa. Esta última ganha e começa a obrigar uma adaptação do Zen budismo para a cultura brasileira; por exemplo, eles exigiram que os sutras fossem traduzidos para o português, patrocinaram conferências sobre Zem budismo em português, e começaram os grupos de estudo de sutras. Além disso, eles instalaram retiros para crianças e começaram a dar ajuda e cursos de computador para prisioneiros, como também fornecer ajuda para pacientes de AIDS. Atividades tradicionais como cerimônias, enterros, e adoração de antepassado para atender a comunidade japonesa são ainda executados, mas elas são separados das atividades dos brasileiros de origem não japonesa.

Transplantando o Zen budismo para o Brasil

Até agora nós vimos como Zen budismo tem evoluído no Brasil, seus praticantes, suas motivações, e os conflitos que aconteceram. Porém, é importante enfocar o estudo do Zen budismo no Brasil dentro de uma análise de transposição do budismo para o Ocidente. Embora o Zen no Brasil tenha sua própria história e desenvolvimento, está profundamente relacionado a história e desenvolvimento do budismo Ocidental. A fim de estabelecer esta relação adicional e analisar o Zen no Brasil, eu devo usar as categorias analíticas cunhadas por Martin Baumann, um estudioso alemão que trabalha com a implantação do budismo na Europa. Baumann identifica cinco modos processuais para transplantar uma religião para um novo contexto sociocultural. Eles incluem contato, confrontação e conflito, ambigüidade e alinhamento, reajustes (re-orientação), e desenvolvimento próprio inovador. Baumann explica que o processo de transplantar uma religião particular não precisa cobrir todos estes modos e não devem acontecer necessariamente nesta seqüência.(38)

O primeiro modo, aquele de contato, inclui estratégias de adaptação como a tradução de escrituras. A tradução é uma das preocupações principais de monges, monjas, e praticantes em todos centros Zen, templos, e monastérios onde os brasileiros de descendência não japonesa estão envolviods. Não só os sutras são traduzidos, mas também recitações que são usadas em retiros nas e trabalho manual (samu). Entretanto mesmo traduzidas, estas recitações são cantadas usando um ritmo japonês, isto é, destacando cada sílaba como se estivesse falando no idioma japonês. Além disto, os centros Zen brasileiros produzem materiais escritos em português que discutem o significado da ordenação, fornece explicações e desenhos de como se sentar em zazen e fazer kinhin (caminhada em meditação), e transcreve palestras dadas pelos mestres ou monges que trabalham com os grupos. Além disso, novo meio de comunicação como websites são usados para espalhar os textos.(39) Produzidos pela maioria de templos, centros, e monastérios Zen, estes websites inclui horários de atividades; artigos sobre a história dos templos afiliados, monastérios, e Centros Zen; tradução de sutras; e retratos dos templos e monastérios.

O modo de contato pode levar ao segundo modo processual de transplantação: confrontação e conflito. A confrontação acontece quando "protagonistas da tradição religiosa importada estão preocupadas com apresentar as peculiaridades que contrastam com as tradições existentes".(40) O Ministério Japonês de Negócios Estrangeiros evitou isto quando ele proibiu monges japoneses de vir para o Brasil para pregação antes da Segunda Guerra Mundial. Como mostrado anteriormente neste trabalho, já existiam bastante conflitos culturais entre brasileiros e japoneses; o Governo japonês não queria transformar o religioso e mais um. Estes conflitos surgiram realmente quando a comunidade de japoneses e de brasileiros de descendência não japonesa começaram a compartilhar o mesmo espaço religioso em Busshin-ji. Como nós mencionamos anteriormente, a comunidade de japoneses e brasileiros de descendência não japonesa não aceita as práticas do outro grupo como "budismo verdadeiro".

"Ambigüidade e adaptação" é o terceiro modo de transplantação. Baumann explica que existem enganos inevitáveis e má interpretações que acontecem quando transplantamos uma religião para um novo contexto sociocultural. "Para os membros da cultura anfitriã só é possível interpretar e entender os símbolos, cerimônias ou idéias da tradição religiosa importada em base a suas próprias concepções. Os portadores da religião estrangeira compartilham problemas semelhantes de compreensão no que se relaciona à nova cultura e sociedade. Como conseqüência desta ambigüidades contato inevitáveis irão surgir."(41) Por causa do ambiente católico romano prevalecente, muita da terminologia usada ao se falar de budismo no Brasil tem origem no catolicismo romano. Por exemplo, cerimônias como enterros são chamados "missas"; o abade é chamado "Bispo"; e existem menções de "paraíso", "inferno", e "rezar".

Além disso, existem ambigüidades também intencionais que são parte de uma estratégia para fazer a religião estrangeira menos exótica para a cultura anfitriã, e fazendo isso, reduzir conflitos. Isto envolve enfatizar semelhanças e vínculos com conceitos da cultura anfitriã. Tal delineamento ambíguo pode ser observado em Busshin-ji, onde os feriados brasileiros são comemorados com a contra parte japonesa. Por exemplo, o Dia das Crianças (12 de outubro) no Brasil é comemorado nesta data, mas com um festival para Jizo, o bodhisattva que cuida das crianças no Japão. Além disso, o brasileiro "Dia dos Mortos" (2 de novembro) é comemorado nesta data, mas com referências a Obon, o festival japonês para os antepassados falecidos.

No mesmo contexto, o Soto Zen no Japão começou a enfatizar a conotação ecológica do budismo como uma estratégia para mostar um budismo moderno que esteja afinado com assuntos mundiais atuais. Isto é realizado através de "Caminho Zen", uma revista japonesa escrita em português especialmente para praticantes brasileiros. Realmente, uma das razões dadas por muitos praticantes brasileiros de origem não japoneses para justificar sua migração para budismo é a conexão da religião com ecologia.(42)

Em uma palestra em um sesshin (retiro) em Porto Alegre, Roshi Moriyama relacionou o budismo com a filosofia grega. Através desta aproximação, o mestre comparou o termo "Apathia" (falta do sentir), criado pelo filósofo grego Zenon, com a idéia de "Atarakushi" (aquietar o kokoro/espírito). Fazendo isto, Moriyama trouxe a meditação Zen para um contexto mais íntimo do Brasileiro/Ocidental. Ele terminou sua conferência dizendo que está estudando outros "budismos," porque "em um mundo globalizado as pessoas têm acesso a um número crescente de religiões, e a religião verdadeira é a que é mais íntimo ao praticante (14 de fevereiro de 1998)." Tokuda faz também uso de ambigüidades intencionais em suas citações freqüentes da Bíblia e comparações de Jesus com Buddha.(43) Semelhantemente, ele compara o estado extático mencionado pelos místicos Cristãos, São João de La Cruz e Meister Eckhart, com a experiência de iluminação no Zen. Tokuda diz que não existe nenhuma diferença entre o Ocidente e Oriente relativo a este estado de êxtase. Ele até se refere a imagem de Deus, afirmando que o cristão pode experimentar uma união com Deus semelhante ao satori:

Como São João de La Cruz disse: a noite do juízo, a noite do espírito, a noite da alma. Através desta viagem interna, nós começamos a deixar o mundo exterior e começamos a trabalhar com nosso mundo interno, mergulhando em nosso subconsciente, em nosso inconsciente. Quando nós chegarmos à parte inferior desta escuridão, existe uma união com Deus, com carinho. Para esta experiência, o Zen dá o nome de iluminação, satori.(44)

Baumann acrescenta que uma religião estrangeira pode obter emprestada características da cultura anfitriã, por exemplo, estruturas organizacionais. Todos os templos e monastérios no Brasil obedecem a lei brasileira e são legalmente registrados como organizações não lucrativas. Além disto, eles são administrados como uma organização brasileira seria: o templo em São Paulo e os Centro Zen por todas as parte o Brasil tem um presidente democraticamente eleito e um quadro de diretores.

O quarto modo, "recomposição ou re-orientação," é uma crítica das ambigüidades que surgiram. A religião estrangeira tenta reduzir as ambigüidades a fim de recuperar a identidade da tradição religiosa. Um dos exemplos deste uso de Baumann é a ordenação tibetana dada as pessoas. Quando o budismo tibetano chegou na Alemanha, a cerimônia de refúgio budista era transmitida imediatamente para as pessoas que estavam assistindo a cerimônia. Porém, uma década mais tarde, iniciações só são oferecidas depois de uma preparação completa. Tal é o caso do Zen budismo brasileiro. Até os anos 80, monges japoneses tradicionais davam ordenação para descendentes japoneses sem qualquer processo ou preparação. Igualmente, nos anos 90, Roshi Moriyama dava a ordenação para brasileiros de origem não japonesa quando era pedida. Porém, depois de chegar do Japão, a abadessa Coen começou a executar cerimônias mais formalmente e estritamente, estabelecendo um curso de preparação de dois anos anterior a ordenação.

As últimas das estratégias de transposição, "desenvolvimento próprio inovador," lida com a criação de novas formas e interpretações inovadoras da religião na cultura anfitriã. Esta gera uma tensão com a tradição em que a religião foi desenvolvida. Muitas inovações aconteceram nos Estados Unidos e na Alemanha. O feminismo determinou uma nova condição para as mulheres em budismo. Outro exemplo é a organização democrática dos Centro Zen em vez da hierarquia rígida. No Brasil, a tensão entre o budismo japonês e budismo brasileiros marca as inovações que estão acontecendo. Tais inovações estão sendo principalmente importadas do discurso Zen Ocidental.

A apropriação e construção do Zen que aconteceram em muitos países Ocidentais tiveram um ponto de partida semelhante. D.T.Suzuki—um dos primeiros estudiosos japonês a escrever sobre o Zen em inglês — e os estudiosos da escola de Kyoto foram fundamentais para a criação de um discurso Zen no Ocidente. Como Robert Sharf observou, para Suzuki Zen é uma "experiência pura—ahistorica, experiência transcultural de 'subjetividade pura" que transcende totalmente o pensamento discursivo."(45) Sharf diz que Suzuki estava escrevendo durante o período do budismo Nacionalista (Meiji New Buddhism—Shin Bukkyoo) "como uma resposta para a universalização Ocidental do discurso." Sob esta pressão, Suzuki e muitos outros escritores como Okakura Kakuzoo, Watsuji Tetsuro, Tanabe Hajime, e Nishida Kitaro —influenciados pelas idéias de nihonjinron (o discurso da singularidade japonesa) — lutava para recriar a identidade nacional japonesa como algo especial que era identificado com a Via do Samurai e o Zen budismo. Para estes autores, o Zen, como a essência do Espírito japonês, denotaria a superioridade cultural do Japão. Além disso, porque é experimental e não uma religião, o Zen podia sobreviver às tendências de esclarecimento do Ocidente e era visto como racional e empírico.(46) A expansão global do budismo Zen levou as idéias de Shin Bukkyoo com ele. Porém, eles foram adaptados, indigenizados, e cruzados localmente. Semelhantemente, o Zen brasileiro tomou parte deste processo de "glocalização" do Zen budismo (um processo que Roland Robertson terminológicamente especificou como a mistura do local e do global).(47) As entrevistas que eu realizei com praticantes brasileiros de origem não japonesa mostrou que seu interesse no Zen budismo é o resultado da influência dos Estados Unidos, através da mídia, (48) livros Zen,(49) cinema,(50) e viagens. De fato, todas as pessoas entrevistadas afirmaram que seu primeiro contato com o Zen foi através de livros.(51) Os Estados Unidos é uma fonte forte de idéias e material Zen por várias razões. Por exemplo, o inglês é mais acessível para brasileiros que o japoneses. De fato, a maioria dos livros Zen agora disponível em português foram originalmente escritos em inglês. Além disso, devido ao fato que estes praticantes virem da classe média de nível intelectual superior e a maioria serem de profissionais liberais, muitos deles podem ler os livros em inglês antes deles serem traduzidos. Alguns podem comprar os livros sobre Zen via Internet (www.amazon.com) e/ou subscrever revistas budistas americanas como Triciclo. Alguns praticantes até escolhem viajar para Centros Zen centro estrangeiro.

A classe média superior urbana brasileira busca o Zen budismo porque ele atrai intelectualmente como uma filosofia de vida. Suas preocupações principais são, entre outras, aliviar a tensão e adquirir paz interna, tornando este campo simbólico em uma miscelânea de religião e lazer. A fim de ter paz interna, os praticantes sentem que eles têm que procurar em seu "próprio interior." Muito freqüentemente, as pessoas que eu entrevistei disseram que eles buscaram meditação Zen como um caminho para aprender sobre eles mesmos. A meditação Zen funcionou ou no lugar da psicoterapia ou junto com ela.(52)

O antropólogo francês, Louis Dumont, afirma que no mundo contemporâneo, a prática religiosa é uma escolha privada.(53) Em um processo de bricolagem, o praticante escolhe características de práticas diferentes para responder suas indagações espirituais. Deste modo, cada praticante constrói sua religião como uma praxis sem igual que é diferente de todo os outros, misturando várias tradições a fim de construir uma nova espiritualidade contemporânea. Existem vários grupos de práticas associadas com budismo Zen no Brasil que são reincidentes nas entrevistas: práticas de ioga curativa, Shiatsu, Do in, Tai Chi Chuan, acupuntura); práticas de compreensão própria (muitos tipos de psicoterapia, astrologia); artes marciais (Ai Ki Do, caratê); hábitos de comida macrobiótica e vegetarianismo); e outras religiões (Espiritismo,[54] religiões africanas, Mahikari [55], Rajneesh/Osho[56]).

O Ocidental construiu um Zen, que foi apropriado, cruzado e nativisado no Brasil, e é ainda um fenômeno novo que precisa ser melhor estudado. Este artigo foi planejado para ser um primeiro esboço das tendências principais deste fenômeno.

Conclusão

Apesar da comunidade japonesa no Brasil ter deixado budismo para atrás e adotado o catolicismo romano como uma forma de ser aceita no novo país, muitos brasileiros de descendência não japonesa tem aderido recentemente ao budismo, como nós vimos neste estudo. Para estes brasileiros de origem não japonesa, a prática principal do Zen budismo envolve meditação (zazen) e retiros (sesshin). O Zen budismo é visto mais como uma filosofia que uma religião. Como tal, o Zen como praticado no Brasil está diretamente relacionado ao Zen construído no Ocidente.

Uma das novas características do Zen brasileiro é um retiro para crianças e adolescentes que acontece duas vezes por ano (durante os feriados da escola) em Busshin-ji, o templo na Cidade de Săo Paulo. Em geral, os pais das crianças săo praticantes do templo. De forma interessante, nestes retiros, crianças de ambas origens japonesa e japonesas aprendem zazen e conceitos budistas através de representação de teatro, desenho, e jogos. Embora seus pais façam práticas separadas, as crianças já estão compartilhando o mesmo corpo de idéias sobre o que o Zen budismo é.

Desde 1999, Busshin-ji tem inovado também através de seu trabalho com prisioneiros (ensinando a eles zazen e dando também classes de computador) e com pacientes de AIDS. Esta é a primeira manifestação do denominado "budismo engajado," que é mais freqüentemente visto no Ocidente. Além disso, Coen, a abadessa do templo de Busshin-ji, está estabelecendo também debates inter-religioso com católicos romano e é regularmente convidado para dar conferências nas universidades através do Brasil.

Além disto, diferentes escolas budistas no Brasil estão reunindo-se em Cyber espaços. Muitos centros budistas são ligados por meio de websites. Existem três foros de discussão ecumênica e duas listas na Internet produzida no Brasil para praticantes brasileiros. A maioria dos centros budistas têm uma comunicação em que eles comunicam seu horário de atividades, publica revisões de livro, e anuncia livros e produtos para prática. Existem também quatro revistas budistas publicadas trimestral no Brasil. Duas delas são exclusivamente de Zem budismo: Flor do Vazio é publicado no Rio de Janeiro, e Caminho Zen é publicado no Japão pela escola de Soto no idioma português, e é especificamente planejado para o mercado brasileiro. Bodigaya e Bodisatva incluem artigos que concentram-se principalmente no Zen, budismo tibetano e Theravaada.

O fenômeno do budismo está ainda muito recente no Brasil. Evoluiu muito mais rápido na última década que nos anos anteriores. Embora muito do que tenha sido feito foi refletido nas experiências do budismo nos Estados Unidos e na Europa, algumas das características brasileiras já são claras. Embora incipiente nesta fase de formação, nós podemos observar o fundir de ensinos e cerimônias budistas com práticas e conceitos não budistas. Muitos praticantes tiveram e ainda têm um fundo católico romano e migraram para cultos africanos e espirítas antes de encontrar o budismo. Esta bricolagem está evoluindo e, no tempo devido, pode criar um Zen brasileiro e um budismo brasileiro, inovativamente combinando o local e o global em uma forma de budismo regionalizado.

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